"Mate-Me Por Favor" - A Psicologia dos Efeitos do Feminicídio
- camaraescurarevist
- 24 de nov. de 2020
- 2 min de leitura
Atualizado: 2 de dez. de 2020
Por Marcela Akemi
“Sangue é vida”

Indicado a melhor filme no Festival de Veneza de 2015, Mate-Me Por Favor é o primeiro longa de Anita Rocha da Silveira, uma obra brasileira de terror psicológico que trata de maneira experimental temas como feminicídio, sexualidade na adolescência, religião e sadismo.
Barra da Tijuca, adolescentes da região temem pela epidêmica onda de assassinatos no bairro que vitimiza especialmente jovens mulheres. Bia, de 15 anos, afetada pelo medo (e também desejo) de sua morte prematura, assim como a ausência misteriosa de sua mãe e os conflitos com seu namorado, desenvolve progressivamente comportamentos estranhos e mórbidos, que se refletem no seu relacionamento com suas amigas e na sua sexualidade.
O horror no filme, que apesar de causar choque já nos primeiros instantes, também ocorre de maneira sutil, inesperada e até cômica, como na solidão do irmão de Bia, as lendas urbanas de suas amigas, a ausência de adultos e a canção da pastora popstar da igreja local.
A maneira como os atores frequentemente olham para a câmera também é uma característica incomum que Anita explora muito e causa desconforto, como se os personagens estivessem tentando nos comunicar algo pelos seus olhares, que expressam simultaneamente “me ajude” e “você é o próximo”.
O desfecho do filme, sombrio e genial, mostra a eventual conformidade e aceitação das jovens com os destino mórbido que elas já passaram a esperar: ser a próxima vítima, um comportamento que, ainda que tenebroso, é apenas uma consequência da constante ansiedade e horror dos casos de feminicídio que as cerca.

Tanto em temática como em execução, é possível ver como o filme é extremamente inspirado em filmes de David Lynch, especialmente Twin Peaks (1990-1991) e Veludo Azul (1986), trazendo esses cenários tipicamente americanos ao Rio de Janeiro, com direito a funk e bailes de formatura abrasileirados.
É um filme para ser visto sem expectativas de um território familiar, pois ele quebra constantemente com as estruturas clássicas de narrativa e técnicas (às vezes com mais sucesso que outras). Ele trata temas como assédio e feminicídio com mistério, curiosidade e sadismo, o que pode ser muito problemático, mas como visto na entrevista dada para a Trip TV no YouTube, entendemos que a diretora tomou a liberdade de projetar os seus próximos sentimentos e visões em relação à tais situações que, como a grande maioria das mulheres, ela mesmo já enfrentou em algum nível, o que talvez seja mais um sinal de expressão artística do que apenas uma romantização cruel sobre tais atos.
Em termos mais técnicos, a trilha sonora do filme é incrível e atmosférica, ajudando muito a narrativa quando a imagem e o ritmo às vezes lento do filme apenas não são impactantes o suficiente.

Assisti a esse filme pela primeira vez como uma menina de 17 anos e posso dizer que me identifiquei muito em vários momentos do filme, como a ansiedade de voltar para casa à noite sozinha e a curiosidade entre os limites da sexualidade, e apesar de não ser um filme tecnicamente deslumbrante, foi meu preferido do gênero por um tempo significativo, então não posso deixar de indicá-lo para os que se identificaram com a temática.
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