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Cinema é política

  • camaraescurarevist
  • 14 de out. de 2021
  • 3 min de leitura

por Cássio da Fonseca Bossert

revisado por Mariana Peixoto


O cinema brasileiro parece viver um loop. A busca por liberdade para poder simplesmente se expressar, e o poder de ser contra um Estado opressor, volta a ser hoje a nossa realidade. Ao estudar rapidamente a história e trajetória do cinema brasileiro, somos capazes de encontrar esse padrão na história.

Em todos os momentos que o cinema mundial passou por dificuldades, sempre se aflorou o lado político e de luta. Eu costumo pensar que, a falta de recursos e a falta de estrutura, obrigam os criadores a serem de fato criadores e não máquinas ou meros técnicos sem alma. É preciso pensar.

Vamos recuar no tempo e traçar brevemente, um panorama geral do cinema no Brasil. Temos nosso início como todos tiveram, apenas uma câmera, registrando um momento, de um cotidiano qualquer. O cinema foi crescendo, cada vez mais sendo aceito e procurado pelo público e com isso o dinheiro foi aparecendo. Começam a surgir grandes nomes como o mestre Humberto Mauro, Nelson Pereira dos Santos, a lista é grande. Aqui começam então a surgir filmes politizados. E por fim, chega o cinema novo. Encabeçado pela Nouvelle Vague, que ao mesmo tempo foi inspirado pelo Neo realismo, o cinema novo não contava com grandes recursos no seu início. O mesmo podemos dizer do cinema marginal. Cineastas lutavam para conseguir financiamentos. Mas não deixavam de produzir. Uns ajudando aos outros, algo que parece ter se perdido no nosso cinema. A turma do cinema novo, sempre tratava de assuntos mais politizados, colocando o dedo na ferida. Com críticas sobre o sistema político brasileiro, uma enorme quantidade de filmes foi lançada.

Então veio a ditadura e com isso o cinema novo foi jogado para escanteio. Se fazer cinema já era difícil, sem os incentivos dos governos, tudo se tornou mais difícil ainda. Além da falta de verba, a censura também contribuiu com a tentativa de calar os artistas que eram contra toda a opressão do Estado. O que surge então no cinema nacional? A pornochanchada, que veio para “salvar” a indústria cinematográfica. A pornochanchada era considerada por muitos como um simples cinema de entretenimento, que não oferecia perigo para o Estado. Porém, mesmo com todo aquele catálogo de filmes machistas, com muita mulher pelada e bacanal, alguns diretores conseguem, incrivelmente, burlar a censura e fazer duras críticas ao Estado opressor. Um documentário recente chamado Histórias Que Nosso Cinema (Não) Contava, da cineasta Fernanda Pessoa, expõe essas críticas e revela como esses cineastas da pornochanchada politizaram filmes que eram de entretenimento.

O tempo passou, o cinema não morreu, a ditadura acabou, mas o cinema novo não voltou. Passamos alguns anos de nossa história convivendo com dezenas de filmes ordinários, que pouco contavam, com histórias fracas e banais, claro que falando em termos gerais, época em que Xuxa e Trapalhões são os campeões de bilheteria. A explosão da televisão e a rede Globo ajudaram a manter esse cenário por um tempo. O cinema nacional foi se reinventando, mas o cinema político demorou um pouco para voltar a ser o tema principal das telas nacionais.

Aos poucos eles foram voltando, novos cineastas foram surgindo, tanto de ficção quanto de documentário, e o cinema brasileiro foi voltando ao radar no cinema mundial. A fomentação para o cinema nacional foi cada vez mais crescendo e com isso produções mais bem elaboradas foram surgindo. Mas dinheiro não está relacionado a criatividade, muito menos com cinema político. Como disse lá no começo, a falta de dinheiro e as dificuldades no sistema, obrigam cineastas a serem criativos, obrigando a pensarem em soluções inteligentes para poderem contar suas histórias.

Se não tem dinheiro para fazer uma explosão, bom, que tal usar o áudio! Não tem dinheiro para fazer um trem passando, que tal utilizar a luz, como fez Charles Chaplin!

Seguindo nossa linha do tempo, chegamos aos dias atuais. Para quem não viveu na ditadura militar, como eu por exemplo, acredito que o que estamos passando seja um pouco parecido com o que os cineastas viveram. Eu disse um pouco, ainda não temos torturas, prisões, censura direta. Aqueles cineastas foram heróis. Mas não que hoje esteja fácil. O cinema atravessa uma etapa bem dura e difícil no Brasil. Grandes cortes nos investimentos, falta de apoio geral, fora a crise mundial por conta da pandemia. Mas novamente o cinema não morreu e não vai. Temos novamente uma geração de excelentes cineastas surgindo, que mesmo com toda a falta de tudo, estão produzindo. São obrigados a pensar, como disse Robert Bresson, “Não pense em seu filme fora dos meios que você tem”. Cinema político é cinema que pensa.


Fontes:

Pessoa, Fernanda, Histórias Que Nosso Cinema (Não) Contava, 2017

Bresson, Robert, Notas sobre o cinematógrafo, 1977

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