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Um Olhar Para os Filmes da Nossa Universidade: "O Conforto das Ruínas" e "Mamãe Tem um Demônio"

  • camaraescurarevist
  • 24 de nov. de 2020
  • 7 min de leitura

Atualizado: 2 de dez. de 2020

Por Catarina Silva Bijotti


Ocorreu durante a semana Play rec na quinta-feira, 15 de outubro, a exibição de dois trabalhos de conclusão de curso dos formandos de 2019, seguido por um debate mediado pela professora Tatiana Travisani, que também orientou ambos os projetos.

Apesar de haver em outras edições da REC espaço para a exposição dos trabalhos de alunos, os dois TCC's em questão - junto a outros projetos elogiadíssimos que por questões de tempo não foram expostos na semana, como o também citado na palestra Quinze, também do ano passado, dirigido por Isis Caroline - parecem entrar, como a Tati comentou, para os projetos clássicos da universidade.

Os projetos muito bem elaborados desde o pitching até a distribuição são modelos de sucesso para os alunos que ainda estão realizando ou vão realizar seu projeto final. Ambas as equipes agradeceram os professores, especialmente Tati Travisani, pela orientação, e assim se seguiu para as exibições e falas das equipes.


Mamãe tem um demônio (2019), dir: Demerson Souza

Vamos fazer nossa tatuagem no cinema brasileiro” - Demerson Souza


Figura 1: Pôster do filme tirado do IMDb

O primeiro filme exibido foi Mamãe tem um demônio. A história se baseia nas divas da televisão dos anos 90 e brinca com as teorias populares de estrelas que fazem pacto com o diabo (como a Xuxa, por exemplo). A diva é Tete Barilove, cantora de sucesso adorada pela menina Beni. Um dia, Tete é encontrada morta em um suposto suicídio. Trinta anos depois, Beni ainda questiona o que realmente aconteceu com a cantora, até que uma noite tudo se revela.

Na conversa estavam presentes o diretor Demerson Souza, a diretora de arte Ana Bettoni, a figurinista Renata Aloise, o diretor de fotografia Gabriel Fonseca e o sound designer Guilherme Gila.

Uma das marcas da produção é a equipe numerosa, direção de arte impecável e trilha sonora original que fazem com que Mamãe pareça uma superprodução do cinema universitário (e de certo modo o é). Algumas das diárias chegaram a passar de 12 horas, além de gravarem uma cena musical no estúdio A e em locações em São Paulo e Mogi das Cruzes.

Durante a conversa, a diretora de arte Ana Bettoni disse que foi um desafio fazer tudo com poucos recursos, e que o resultado só foi possível com muita ajuda da equipe e amigos. Ela mostrou com orgulho os LP's, capa de jornal e pôsteres que criou para o filme. Estes foram possíveis graças a uma diária inteira dedicada a fazer uma sessão de fotos com Soraia Costa, que interpreta Tete Barilove. Sessão esta que foi realizada na casa da atriz (que também é fotógrafa e por isso tinha um estúdio de foto em sua casa) e com suas roupas, como comentou a figurinista Renata Aloise.


Figura 2: Capa de jornal criada para o filme. Tirado do IMDb


A ajuda da atriz com o figurino, como comentado, foi crucial para a produção. Mas não é só a isso que se resume sua importância no projeto. A atriz, que ganhou com o filme o prêmio de melhor atriz coadjuvante no festival Curta Suzano, incorporou a personagem desde o teste de VT, como brincou a equipe durante a conversa.

No dia do teste, em que eu e um amigo participamos por fazer a assistência de direção do filme, diversas atrizes foram avaliadas por Demerson Souza, Guilherme Gila e Nina Denobile, diretora de atores do projeto. Além de passar o texto, elas também teriam que cantar uma música. Depois de um tempo analisando as atrizes o meu amigo entra na sala e comenta: “tem uma mulher lá fora que veio incorporada na personagem”. Após muito tempo e cansaço entra a última atriz que eles teriam que avaliar. Soraia entrou “vestida de Tete” com uma manga na mão (assim como sua personagem, que devora sem cerimônia uma manga no filme) e ali se decidiu que Soraia era Tete. A atriz, como comentou Renato Coelho, foi um achado para a equipe: além da boa atuação, ainda cantava bem, tinha muitas roupas que ajudaram no figurino e contava ainda com um estúdio de foto em casa.

A conversa seguiu com a fala de Guilherme Gila, que comentou um pouco sobre a trilha sonora original. Gila é um fã de musicais, como pode ser percebido por um pôster de Hamilton pendurado na parede de seu quarto. Para ele, o cinema musical no Brasil ainda é um pouco “complicado”, mas isso não o desanimou de criar duas músicas originais para o curta-metragem universitário. As músicas e a coreografia do filme foram feitas por ele na pré-produção. Fera e Vestido Azul são a carga de peso que o filme precisava para entrar no clima dos anos 90. Ele comentou que fica feliz quando alguém pergunta de quem são as músicas, como se achassem que elas já existissem antes do filme. De fato, as músicas são ótimas (Fera é um chiclete que aparece na sua cabeça quando você menos espera) e foram postadas no Spotify e Deezer (quem quiser ouvir é só procurar por Tete Barilove).

Por fim chegou a vez dos comentários de Gabriel Fonseca, diretor de fotografia (que também dirigiu junto com Stephanie Oliveira o documentário Ruído Branco, exibido no 30º Festival Internacional de Curtas Metragens de São Paulo - Curta Kinoforum). Para ele, o desafio foi mesclar o pop com o terror. Para isso brincou com o passado e presente do filme: se na TV tudo aparecia colorido e artificial, fora dela é tudo mais frio.

Mamãe tem um demônio já rodou diversos festivais e vale a pena ser assistido por todos os estudantes de cinema.

O Conforto das Ruínas (2020) Dir. Gabriela Lourenzato

Quero fazer cinema para as pessoas verem” – Gabriela Lourenzato


Figura 3: Pôster do filme tirado do IMDb


O Conforto das ruínas é um curta-metragem que faz um jogo com ficção e documentário enquanto denuncia a situação dos moradores da Ocupação Douglas Rodrigues e questiona o cenário político atual pelos olhos de uma criança. O roteiro nasceu por uma necessidade da diretora se expressar após a vitória de Jair Bolsonaro nas eleições de 2018.

Estavam presentes na conversa a diretora Gabriela Lourenzato e a produtora Daya Costa. Gabriela conta que inicialmente os atores profissionais participariam da parte documental do curta, enquanto os não atores participariam da parte ficcional, auxiliando nesse jogo de ficção x documentário proposto pelo curta. Mas, durante o andamento do projeto, isso foi um pouco alterado.

Aliás, mudança parece ser a palavra-chave do projeto, que foi se alterando conforme as necessidades. A atriz mais jovem, por exemplo, não sabia ler e por isso suas falas foram se alterando conforme a atriz ia compreendendo o que o seu texto queria dizer. Isso acabou deixando tudo mais natural nas gravações. Além disso, a ocupação é um ambiente vivo, que se altera constantemente. Naturalmente, a produção foi se adaptando a cada mudança necessária. As únicas cenas que não sofreram alterações segundo a diretora foram as cenas estéticas, como a cena nos trilhos.

Outra peça central no projeto foi o respeito ao lugar e seus habitantes. Respeito este que não deveria nem ser comentado por ser algo óbvio que se espera de toda produção cinematográfica, como comentou Tati Travisani. Mas, como sabemos, não é difícil encontrar filmes brasileiros (até mesmo os de diretores prestigiados internacionalmente) que usam a lógica do realizador colonizador. Ou seja, filmes que exploram a pobreza de um lugar e não dão nada em troca. Parasitas que utilizam das dificuldades da população brasileira para fazer filmes que serão bem aceitos nos festivais de cinema. No caso de O Conforto das Ruínas, a equipe tomou cuidado com essa questão e se aproximaram bastante das atrizes, como comentaram: “Ou é uma troca ou você toma e não devolve”. Além disso, a diretora já tinha um contato com o local antes da produção, pois mora perto da região.


Figura 4: Foto da equipe durante as gravações tirada do IMDb


Algo em comum (mas totalmente diferente) com Mamãe tem um demônio é a criação de uma trilha sonora original na pré-produção. Enquanto em Mamãe a trilha sonora nos leva às rádios brasileiras dos anos 90, a equipe de O Conforto chamou duas percussionistas profissionais para trabalhar com instrumentos não convencionais, como bexiga e panela, para criar a trilha sonora do filme. A diretora ainda conta que foi tudo uma experimentação: não se tinha certeza de muita coisa quando a trilha foi criada, mas encaixou.

O Conforto das Ruínas é outro excelente curta-metragem universitário que vale a pena ser assistido por todos os estudantes. Utilizando-se do jogo entre ficção e documentário, com pitadas de um realismo fantástico e uma excelente fotografia, o filme tem o mérito de criar algo único e necessário.

Finalizo com as palavras da professora Sheila Schvarzman após a exibição do filme:

“Que beleza! Que potência. Que felicidade saber que vocês fazem isso!! Obrigada Gabriela e todos vocês por nos renovarem a crença no nosso próprio trabalho e no cinema brasileiro.”


Distribuição dos filmes

Uma questão muito discutida no debate foi sobre a distribuição dos filmes. Ambos têm focos diferentes.

Enquanto Demerson Souza planeja inscrever seu filme em 350 festivais até o final do ano (até o momento ele já se inscreveu em 260), Gabriela Lourenzato planeja inscrever o filme nos festivais maiores durante seu primeiro ano e, depois, nos festivais menores. Além disso, comentou que há vários modos de distribuir o filme além dos festivais (como exibições públicas, por exemplo).

Até o momento O Conforto das Ruínas foi selecionado para os seguintes festivais: mostra competitiva de curtas do VIII Festival de roteiro audiovisual de Porto Alegre (FRAPA), onde ganhou o prêmio de melhor roteiro pelo júri popular; mostra competitiva universitária do CIndie Festival. O filme será exibido em novembro na mostra competitiva nacional de curtas do 27º Festival de Cinema de Vitória e também faz sua estreia internacional na Áustria no dia 18 de novembro no YOUKI International Youth Media Festival.

Mamãe tem um demônio participou dos seguintes festivais: mostra paralela do Festival Fora da Gaveta; festCurtas Fundaj; mostra No Meio da Noite do FestCiMM Festival de Cinema no Meio do Mundo, pelo qual recebeu o prêmio da crítica; o festival mexicano Cortos em Corto; a mostra competitiva Alto Tietê do festival Curta Suzano, que concedeu a Soraia Costa o prêmio de melhor interpretação coadjuvante; a mostra Pax do festival Curta Caicó; o `Legacy’ The Film Club Toronto; Cine Tamoio; Rock Horror in Rio Film Festival, que deu ao curta o prêmio de melhor filme na categoria Brasil Assombrado ; a mostra Famílias Tenebrosas do festival Out for blood, do Reino Unido; Metrô, o Festival de cinema universitário brasileiro, que concedeu ao filme o prêmio do júri oficial; mostra competitiva universitária do CIndie Festival.

Os dois filmes ainda têm uma longa jornada de festivais e merecidos prêmios pela frente.


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